Vice-presidente do TST, Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, critica MPs que atendem patrões sem considerar proteção dos cidadão em meio à pandemia
Ao citar a “reforma” trabalhista implementada em 2017, o magistrado observa que havia o discurso de que as medidas permitiriam a criação de milhões de empregos. “Qual foi a resposta empírica? O que foi prometido não foi entregue.”
Por isso, ele rejeita a insistência no argumento de que é preciso reduzir direitos para garantir empregos. “Não bastou a mentira da reforma? Agora vem outra?”, reage. Segundo Vieira Filho, o mercado já demonstrou que não dá conta da crise. Mais uma vez, é necessária a presença ativa do Estado.
Ideário em xeque
“Esse ideário neoliberal está ficando sem suporte. A pandemia colocou em xeque esse ideário, bem como a ideia da globalização”, diz o vice-presidente do TST. “Isso tudo está mostrando a fragilização desse discurso.” Durante o debate, ele usou algumas vezes a expressão zombie ideas (“ideias zumbi”), bastante citadas por Paul Krugman, sobre crenças que deveriam ter sido eliminadas pela evidências, mas seguem devorando cérebros, como já definiu o economista norte-americano.
O ministro cita Krugman e seu “choque violentíssimo” com o ideário neoliberal, “inclusive das formas de apropriação do Estado pelo capital”. E acrescenta que o chamado mercado se mostrou incapaz de solucionar as questões apresentadas pelo pandemia e a consequente crise econômica. “Um descompasso completo”, afirma.
Ele também critica as recentes medidas provisórias de flexibilização de direitos, como as MP 927 e 936 (que deve ser votada hoje na Câmara). Foram editadas de forma unilateral, lembra, sem participação dos sindicatos, que também são protagonistas do capitalismo. E desrespeitam a premissa da Organização Internacional do Trabalho sobre diálogo social. “Então, não é só uma ideia jurídica da OIT, mas uma ideia econômica também”, diz Vieira Filho.
As MPs, acrescenta, consideraram apenas um lado, o do empregador. Ignoram inclusive a proteção necessária para micro, pequenas e médias empresas em meio a uma pandemia, que concentram muita mão de obra. “Elas são fundamentais na economia. Precisamos proteger os vulneráveis, ou vamos criar um monopólio. Estamos acentuando o grau de concentração em todos os níveis no país, e isso é muito perigoso.”
De invisíveis a essenciais
Ele afirma que “quem apareceu para manter a sociedade viva”, neste momento, foram justamente os trabalhadores, em particular os da saúde, do comércio e os que trabalham por meio de aplicativos. “De invisíveis, transformaram-se em essenciais.”
Assim, as medidas, em vez de serem flexibilizadoras em plena pandemia, precisam assegurar proteção. “Estamos trabalhando com ideias mortas, superadas no mundo. Nós só vamos sair desse quadro se houver mais proteção social”, afirma o ministro. Para ele, os sindicatos também precisam se “reconstruir”, pensar em novas formas de organização e de comunicação, incluindo as novas modalidades de trabalhadores, como as da plataformas virtuais.
O ministro considera o teletrabalho, ou home office, uma tendência irremediável, que não se pode mais descartar. “Mas isso não quer dizer que signifique um trabalho em que haja uma jornada ilimitada”, ponderou. “Em vários países da Europa, essa jornada é regulamentada. É preciso uma nova regulamentação, porque esse é um veículo que veio e vai ficar definitivamente.”
Assim como a questão das plataformas, cuja relação tem sido controversa na Justiça do Trabalho. “Quem precifica é agente econômico, é aquele que efetivamente coordenada a relação de trabalho”, diz o ministro. Ele defende ainda uma “discussão séria” sobre redução da jornada de trabalho, para permitir maior absorção de mão de obra. Mesmo em um “processo crescente de desregulamentação e de desproteção social”, o vice-presidente do TST espera que a pandemia ajude a provocar “um novo movimento civilizatório”, considerando o tripé economia, meio ambiente e questão social.
Fonte: Rede Brasil Atual