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´Mercado´ não pode definir economia do Brasil

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Pacote de Haddad que isenta do IR os que ganham menos e taxa mais as altas rendas é passo fundamental na luta contra a desigualdade social

Por Gheorge Vitti

ARTIGOECONOMIA2024O anúncio de um pacote para buscar equilíbrio fiscal, feito no último dia 27 pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, atende a uma reivindicação histórica do movimento sindical, que há anos pede menos impostos para quem ganha menos e a taxação das altas rendas. Entre as mudanças anunciadas estão a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, beneficiando 36 milhões de contribuintes a partir de 2026 e aliviando um pouco os que ganham menos.

Para financiar o aumento da faixa de isenção do IR, o governo pretende introduzir uma alíquota efetiva de 10% para quem ganha mais de R$ 50 mil por mês. Mas nada muda para quem trabalha com carteira assinada e recebe mais de R$ 50 mil, porque essas pessoas já pagam a alíquota de 27,5%. Atualmente, segundo o governo, o que acontece é que o 1% mais rico da população paga alíquota efetiva de 4,2% de IR. Para o 0,01% mais rico, a alíquota efetiva é 1,75%.

O mercado, onde as altas rendas se concentram, obviamente chiou, e o dólar subiu rapidamente, criando como sempre a sensação midiática de “caos”, que não corresponde à realidade e passa muito longe dos assalariados brasileiros. O Brasil já tem hoje uma das taxas de juros mais altas do mundo, a Selic – que está em 11,25%, mas pode subir ainda mais na próxima reunião, prevista para 11 de dezembro, também como “consequência” das medidas anunciadas.

Com a Selic nesse patamar, o País não cresce, o que pode aumentar o desemprego. Não há investimentos, os trabalhadores se endividam cada vez mais e o pouco que recebem vai para pagar dívidas com moradia, bens de consumo e outros itens no cartão de crédito, de juros altíssimos. Enquanto isso o mercado agradece, pois sobem os rendimentos dos investimentos. O mesmo mercado que se apropria de R$ 1,7 trilhão de recursos públicos todo ano via Bolsa Empresário (renúncias), pagamento de juros e sonegação.

Outras medidas anunciadas por Haddad foram a limitação de supersalários de servidores dos Três Poderes ao teto de R$ 44 mil ao mês – lembrando sempre que o salário mínimo hoje é de R$ 1.412, e manter uma política que priorize sua valorização é essencial – e aumentar a idade de aposentadoria nas Forças Armadas de 50 para 55 anos, acabando com repasse de salários a familiares de militares expulsos ou falecidos, um “benefício” que há muito já deveria ter sido extinto.

A concentração de renda no País está entre as principais causas de injustiça social, e buscar um equilíbrio é fundamental para construção de um Brasil justo. Os super-ricos precisam de taxação maior, com a aprovação de um imposto sobre as grandes fortunas, reivindicação também histórica do movimento sindical. Esperamos que o pacote anunciado seja também um primeiro passo nessa direção, com mais força do que seus representantes e lobistas no Congresso, que tanto atravancam as conquistas em prol dos que ganham menos. 

Embora o Brasil venha ampliando a oferta de emprego, ainda somos campeões em desigualdade, um cenário perverso que depende da economia, da política e da conscientização da classe trabalhadora para eleger representantes que de fato defendam seus direitos.

 

Gheorge Vitti é presidente do Sindicato dos Bancários do ABC

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