Presidente Bolsonaro, sempre defensor da tortura, cria turbulência nas Forças Armadas e deixa País em alerta para autoritarismo; enquanto isso, pandemia de covid-19, descontrolada, bate novos recordes de mortes entre os brasileiros
O golpe civil-militar de 1964 completa 57 anos hoje, 31 de março. Civil porque teve a participação de muitos setores da sociedade, como multinacionais, empresários, igreja, veículos de comunicação – alguns, anos mais tarde, reconheceriam o erro, mas então já teriam se passado décadas de obscurantismo, tortura e assassinatos. De acordo com o relatório final da Comissão Nacional da Verdade foram 434 mortes, com 210 pessoas desaparecidas. Mas o saldo da CNV não computava atrocidades mais recentemente reveladas, como o sequestro de crianças pelos militares (veja mais em https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2021/03/villas-boas-tenta-apagar-historia-ao-negar-sequestro-de-criancas-na-ditadura.shtml).
Neste ano, como em nenhum outro desde que a democracia foi restabelecida no País, a passagem do golpe é marcada por uma grande turbulência nas Forças Armadas. Ontem, os comandantes do Exército, da Aeronáutica e da Marinha pediram renúncia conjunta por discordâncias com o presidente da República Jair Bolsonaro, um defensor da tortura, como revelou em seu voto de impeachment à presidenta Dilma Roussef, quando fez apologia de Carlos Alberto Brilhante Ustra, notório torturador do período ditatorial – foi chefe do DOI-CODI do II Exército, um dos órgãos atuantes na repressão política.
Essa é a primeira vez que os três comandantes das Forças Armadas deixam seus cargos ao mesmo tempo por discordância com o presidente da República. Os generais estariam descontentes com supostas tentativas de Bolsonaro de exigir apoio maior a seu governo e a suas frequentes ameaças de romper com a democracia. Reportagem do Valor Econômico publicada hoje afirma que Bolsonaro vai exigir dos novos generais que assumirão os comandos que seja tratado como “comandante-em-chefe das Forças Armadas”. Abandonado pela alta patente militar, o capitão (que chegou ao posto em acordo para deixar o Exército após ser preso em 1987 por “atos de indisciplina e deslealdade”), estaria insatisfeito também com o tratamento recebido da cúpula militar.
Em meio a uma pandemia descontrolada, com recordes quase diários de mortes pela covid-19 e figurando como o país de pior estratégia para tentar proteger seus cidadãos do vírus, o governo Bolsonaro quer ainda perder tempo “comemorando” o aniversário do golpe civil-militar, o que vai contra a Constituição de 1988 na avaliação do advogado e professor universitário Pedro Dallari. “O país se redemocratizou, criou uma nova Constituição Federal e fixou princípios para o Estado como defensor da liberdade e dos direitos humanos. Portanto, vai contra a lógica da ditadura militar”, afirmou, em participação no Revista Brasil TVT do último domingo (28).
No entanto, o tumulto criado leva setores da mídia e sociedade a temer por medidas autoritárias ou até mesmo um novo golpe – ou autogolpe - vindo da presidência da República. O que, segundo analistas políticos, é improvável, já que Bolsonaro perdeu força entre os militares de maior patente. “Mas o capitão enfurecido ainda não desistiu dos seus planos suicidas de levar o Brasil a uma guerra civil para ressurgir mais adiante como o salvador da pátria, montado num cavalo baio de alguma Polícia Militar, espada em punho, autoproclamando-se D. Bolsonaro 1º”, ironiza o jornalista Ricardo Kotscho.
Enquanto isso, chegamos ontem à marca de 3.668 mortos pela covid-19, e é nesse cenário terrível que o presidente da República parece querer acrescentar, a cada dia, mais desinformação, caos e tragédia.