Representante dos bancários destaca que nova presidenta da Caixa, Daniella Marques, tem o mesmo perfil de “desmantelamento das estatais” de Pedro Guimarães, que deixou o banco após denúncias de assédio sexual
São Paulo – A troca no comando da presidência da Caixa Econômica Federal, com a nomeação de Daniella Marques Consentino, não representa nenhuma mudança para a gestão do banco público. É o que destaca a representante dos bancários no Conselho de Administração da Caixa (CA), Maria Rita Serrano, funcionária da instituição há 33 anos, em entrevista ao Jornal Brasil Atual, nesta quinta-feira (30).
De acordo com a sindicalista, o objetivo da nova presidenta não será diferente da direção anterior, de Pedro Guimarães. Ele foi indicado ao cargo pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), em 2019, mas pediu demissão ontem (29) após a divulgação de denúncias de assédio sexual feitas por várias funcionárias da Caixa. A escolha do novo nome foi confirmada em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) publicada na tarde de ontem. Então secretária especial de Produtividade e Competitividade do Ministério da Economia (Sepec), antes de ingressar no governo Daniella Marques atuou por 20 anos no mercado financeiro e foi sócia-fundadora e diretora de uma empresa de fundos de investimento.
A escolhida é também considerada um braço direito do ministro da Economia, Paulo Guedes. Na prática, é o ministro quem controla o comando da Caixa. Por isso, a representante dos bancários no CA avalia que o interesse em privatizar o banco estatal, amplamente divulgado por Guedes, segue sob a nova presidência.
Problema é o governo
“O problema da direção do banco é a gestão do governo (federal)”, observa Maria Rita. “Então do ponto de vista da gestão interna do banco não acho que vai haver nenhuma grande mudança. A situação já estava complicada porque o objetivo é privatizar a instituição. E eles (do governo Bolsonaro) vão continuar com o mesmo objetivo. Isso só muda se você mudar o governo para um que tenha a preocupação com o país, com o desenvolvimento e com o crescimento. É isso que de fato muda porque se colocará as estatais para contribuir com um projeto de desenvolvimento. Mas não é isso que está colocado neste momento”, ressalta.
O nome de Daniella Marques, contudo, ainda precisará ser aprovado pelo Comitê de Elegibilidade da Caixa, segundo a funcionária. Além de seguir com os objetivos do governo do ponto de vista de gestão, a escolhida para assumir a presidência da Caixa também responde a uma tentativa do governo Bolsonaro de conter o desprestígio do presidente, que tenta a reeleição, com o eleitorado feminino. A imagem de Bolsonaro está ainda mais abalada após virem à tona as denúncias de assédio sexual contra funcionárias do banco por Guimarães, seu apoiador e amigo.
As denúncias de assédio vêm desde 2019. Apesar de o ex-presidente da Caixa negar, em carta de demissão, as acusações, os relatos das funcionárias são contundentes. “Ele me chamou para ir para sauna com ele. Perguntou: ‘Você gosta de sauna?’. Eu disse: ‘Presidente, eu não gosto’. Se eu tivesse respondido que gosto, ele daria prosseguimento à conversa”, relatou uma das vítimas, na condição de anonimato.
Investigação
A representante dos bancários vem exigindo o envolvimento intensivo do CA nas apurações das denúncias de assédio sexual. Ela apresentou ao conselho pedido de seleção e contratação de entidade externa, independente, como forma de assegurar agilidade e segurança de que nem as investigações, nem as denunciantes, sofram algum tipo de cerceamento. Além disso, Maria Rita também questiona o fato das acusações nunca terem chegado ao Conselho de Administração, composto por oito membros, sete deles, incluindo o presidente, indicados pelo governo.
“Elas (denúncias) não foram relatadas ao CA que tem o papel de fiscalizar e inclusive tratar desses casos que envolvem dirigentes da empresa”, contesta a única representante dos trabalhadores no órgão. Em nota divulgada na noite desta quarta, a Caixa assumiu que tinha conhecimento das acusações. A instituição alegou que a investigação corre em sigilo, no âmbito da Corregedoria, motivo pelo qual não era de conhecimento de outras áreas do banco, justificou.
Ainda ontem, o Ministério Público do Trabalho (MPT) notificou e deu o prazo de 10 dias para que Pedro Guimarães e a Caixa se manifestem sobre as denúncias de assédio sexual. Se comprovadas, Maria Rita destaca que o ex-presidente do banco deve responder pelo crime. “O assédio sexual, constatado como crime, principalmente no ambiente corporativo envolve uma relação de poder. A pessoa acima de você, que tem um cargo superior, utiliza desse poder de te demitir, de tirar sua função e te perseguir do ponto de vista do ambiente de trabalho. E utiliza desse poder para assediar e ter favores sexuais. Então é algo absurdo ainda mais se pensarmos em uma empresa do tamanho da Caixa, que tem regulamento de pessoal e uma governança instituída. É um absurdo pensar que isso está ocorrendo”, lamenta.
Saiba mais na entrevista
Redação: Clara Assunção – Edição: Helder Lima